segunda-feira, 27 de junho de 2011

Yellow submarine

O trem subia pela montanha, em trilhos que a rodeavam em espiral.
Naquele vagão do trem havia cinco pessoas, apenas uma acordada, ao lado do filho, o único garoto ali. O homem acordado lia um livro.
Além do som dos trilhos, uma música dos Beatles entoava o ar.
O garoto que dormia, aparentava ter dez ou onze anos. Dormia tão profundamente que parecia estar morto, até mesmo sua respiração era vagarosa. Sua cabeleira loura refletindo a luz do sol – que entrava pela janela, já um pouco empoeirada – causava contraste com seu pijama azul. Sua boca que permanecia fechada durante todo o sono, abriu-se, e nesse momento ele acordou.
– Bom dia Jake.
– Bom dia pai – esfregou o olho direito com a mão direita – pai, nós estamos perto de chegar?
– Estamos filho, muito perto.
– Todos os dias o senhor me diz isso.
– Você quer um café?
– A mamãe estará lá, quando chegarmos?
– Estará. Tome o café agora, e vá trocar de roupa.
Levantou do assento e foi ao banheiro, ao voltar ele continuou a conversa com o pai.
– Eu estou cansado de esperar.
– É, eu também.
– Por que ainda não chegamos, há nove anos estamos neste trem.
– Você já escovou os dentes?
– Já.
A música parou por instante.
– Pai, eu não sei quanto mais tempo sou capaz de esperar.
– O tempo suficiente.
A música retornou a tocar.
– Todos os dias, a mesma coisa. A mesma música há nove anos.
– Eu sei.
– Você lê o mesmo livro há nove anos.
– Pois é.
– Você está me escutando?
– Estou.
– Como você agüenta?
– Do mesmo modo que você.
O garoto fixou o olhar na janela.
– Esta montanha é tão grande assim, ao ponto de ser necessário mais de nove anos para chegar ao topo?
– Sim, é muito, muito grande.
– E quando nós iremos chegar ao topo?
– Em breve, muito em breve.
– Mas a mamãe ainda espera?
– Ansiosamente.
– Há nove anos ela espera?
– Há nove anos.
Ele virou a cabeça em direção ao pai. E olhou-o com um olhar vagaroso e piedoso.
– Pai, mas por que ela não está com a gente?
O pai retribuiu o olhar, não falou nada e continuou a leitura.
– Pai, por que ela não está com a gente?
Nada falou, continuou a leitura.
Há dez anos eu nasci, por que ela subiu a montanha sozinha?
Ela poderia ter nos esperado, não há motivos para ela ter subido sozinha. Qual a mãe que acaba de ter um filho e deixa-o sozinho com o pai?Mamãe está viva?
– Papai... – sua voz tornou-se melancólica e enfadonha – mamãe está viva?
– Ora, como se atreve a fazer uma pergunta dessas? – pela primeira vez, ao que sabia o garoto, ele largou o livro. Olhou nos olhos do filho e apontou o indicador esquerdo em direção de seu nariz, com um ar reprovador – nunca mais repita isso – falou em um tom encolerizado.
– Basta responder sim, ou não.
O homem olhou para o lado direito, esperando que algo acontecesse para interromper aquela cena entre os dois. Mas nada aconteceu.
Uma lágrima escorreu pelo seu rosto. E em choro abraçou o filho.
– Mas pai... – ele também começou a chorar.
Permaneceram naquele abraço, ambos com o rosto molhado de lágrimas. Compartilhavam do mesmo sentimento, do mesmo choro, como do mesmo ar.
– Então o que estamos indo fazer lá?
– Encontrar sua mãe. Ela está no topo.
– Então nós...
– Estamos indo para o topo.
– Para o topo – repetiu o filho.
Permaneceram abraçados durante o resto do dia. Eles nunca haviam sequer se tocado, por isso aquele momento era tão belo.
O trem continuou subindo, e subindo ao topo. Chegariam, um dia eles chegariam lá, ao topo. A música continuava, o trem continuava seu caminho, continuava.
Ao topo.

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