quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Pensamento natimorto

Por prédios e prédios
me perco entre becos de passo em passo
passo minha vida a esse céu,
me jogo neste poema ao léu,
me rogo a um outro eu.
Resido no eu presídio, aprisionado em meus resíduos.

Meu peso me empurra a esses pesadelos
de todo não meus, de todos me resta a vontade de perdê-los.
Me penso e penso para sonhos disfarçados e despedaçados,
sonhos sem sonhos.

Eu então busco um outro coração,
talvez, menos útil num último suspiro, num último giro,
em outra vez que esqueci na mesma tal vez de ser meu próprio ex.

Num cladograma confundo-me entre aborto e amorto,
diluo-me na solução sem divisão de real e surreal:
a invenção do natural de morrer em contrapartida a viver e nascer

sábado, 17 de novembro de 2012

Telefonema

Em teus fonemas me perdi e pedi outras distrações,
outras ações menos importantes que nos deixem mais distantes.
E aquele último telefonema que te foi apenas mais uma cena em teu cinema
me foi quase o fim que me deixou sem mim

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Calo de sentimentos


Continuo a me buscar
e consigo apenas me perder,
me esquecer na inutilidade de tentar te amar,
tentar te convencer.

Eu bem queria te falar de tudo que há em mim,
tudo que encontrei no fim,
tudo que ainda sinto e dói,
mas me calo na dor desse calo de sangue,
permaneço, enlouqueço,
tento me encaixar num lugar em que não caibo - meu corpo -,
tento me encontrar num lugar em que não respiro - a vida -,
tento me aproximar dum lugar que não conheço - o amor

Clareza sem certeza

Apenas sofro em mim mesmo no silêncio árduo que criei,
o silêncio que me arde as têmporas e é imperceptível para ti.
Me escondo nas verdades que já tanto me machucaram
como se fosse um refúgio do que fujo.
Não te falo de minhas dores para não te magoar,
não te falo dos sofrimentos para não te atrapalhar os pensamentos.
Finjo então, finjo e fujo. Finjo estar em outro estado,
finjo ser um outro.
Mas continuo eu mesmo em mim, tão verdadeiro e certeiro,
continuo a gritar o grito impossível de escutar,
continuo a chorar meu choro sem lágrimas, encharcado em mágoas.
Eu continuo a continuar, a caminhar na estrada descontínua em que sempre me perco

sábado, 10 de novembro de 2012

Dia noturno

Na noite de trevas que me envolve,
noite a que me entrego,
a noite obscura que me anoitece e tece a madrugada
partida e encolhida, a madrugada sem vida em que vivo,
me crio num rio de tempo atemporal, floral sem qualquer radical,
sem nada de maternal ou paternal,
o rio quase lamaçal nesse lamaçal de nosso pantanal.
E então que surge o sentimento virginal e matinal
sob o sol, sob luz que me induz
a um outro calor sem amor, calor que me arde na infinita tarde,
sem nexo, do plexo que me sustenta as veias de viver em teus nervos de ser.
E continuo na caminhada à noite, no ciclo, no vício, no dia,
a poesia, quase alegria, sem motivo, sem tempo,
determinada com tormentos

domingo, 4 de novembro de 2012

Assustado, mudado

Mais um resultado resultado dos cálculos renais que me destroem em outros canais,
um outro assunto natimorto abordado, um novo aborto absorto e torto.
Com tudo sou sem nada, absolutamente. Absoluto resoluto num luto de tudo,
mudo, muto o abrigo em que me obrigo um amigo, ligo, brigo, luto.
Brinco com teus brincos de mundo, de tudo, te lembro um futuro dezembro,
te faço nossos membros, te faço nossos ossos, te visto num visto
revisto teu vestido, íntimo te dito, o que é tido por ti,
o que é dito por mim, o que é fim de carmim, o que é não e sim,
o que é nós enfim

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

Como falto ao asfalto

Tua alma é feita com mesmo material que compõe a paixão inatingível,
paixão que arrebata, mata.
Tua música é o que me aprisiona em teus cabelos
e me faz crer em teu novo jeito de se dar,
teu próprio jeito de observar
cada coisa que nos compõe,
que faz ser de tudo uma outra coisa - sinônimo de amor.
Eu tento reaver teu evento num único momento
que como todo pensamento me é um tormento
e o desinvento, me levo ao vento.

Em tuas veias corre esse asfalto
que me alimenta,
asfalto feito de terra dura, suja, amada.
Tua pele é de plástico
- que polui e desanima -,
plástico que desentendo, revendo.

Tu és fabricada pelo mesmo que fabricou a lua,
o brilho de ser e viver,
a luz de se perder, a luz do querer.

Teu corpo:
fabricado
como fabricaram a poesia,
montado como montaram cada palavra,
produzido como produziram o amor

Desinteressantes paixões

Teu olhar me impregna e me faz ver meu novo ser
em tua nova razão de viver, de conhecer outra inconsequente paixão
que te renova a vontade, te refaz a verdade e te imita a realidade.
Teu olhar é a parte indescritível que em ti é o que tanto tens,
teu olhar é o que tanto necessito olhar,
teu olhar é quase a razão de amar,
quase a consequência de cantar.

Teus olhos são as estrelas que iluminam o céu na noite mais obscura, 
teus olhos têm a mesma luz que admiro no brilho da lua,
têm o mesmo amor que te reflete em mil reflexões,
em mil outras paixões

Sem precisar falar

De não saber o que é verdade,
estar poluído com a mais suja vaidade,
de se perder no que há de mais desnecessário.
É tudo isso que me faz perguntar se há outro inventário,
um lugar em que eu caiba em mim.

Eu busco, então, não saber de nada, enfim,
tento não saber de mim.

É em ti que me busco
numa outra parte desconhecida da poesia do amor,
tento sentir na mais complicada paixão o mais puro ardor,
para me perder em teu complexo calor,
me perder no teu querer ser,
no teu viver,
para nunca te perder